segunda-feira, 30 de julho de 2012

Cucurrucucú




- Diga-me, qual seu problema?


- Desejos contidos,
vontade de ir e ficar,
saudade do que não aconteceu,
sonhos que eu tenho que abafar,
coração partido.

Não escrevo para alguém


Permaneço cá em canto meu,
escuro, ébrio e só.
Apenas com uma taça de vinho Merlot,
perdida em lábios teus.
Que lábios, tão grandes.
Renuncio, porém, todo encanto,
toda paixão,
em troca do sossego,
da paz de não sofrer
por desamor.


Autorretrato


Quero tudo intensamente, sou estranha e explosiva. Vivo dentro dos meus pensamentos, o que me da caráter viajante. Não sei (ainda!) ser pela metade, e por isso peço perdão. Sou por inteira, assim como os desejos meus. E, assim sendo, desisto. Dos sonhos, dos outros, e, às vezes, até de mim. E então peço perdão novamente.

sábado, 28 de julho de 2012

Conto sobre uma demissão forçada


E então, depois de anos trabalhando maquinalmente no mesmo lugar, ela resolveu pedir as contas (por conta dos desejos do marido). Trabalhou seus últimos dias como sempre, com um certo lamentar. Lavou as calçadas, para deixá-las limpas e impecáveis, como costumava fazer. Tirou o pó, lavou os panos. Fez chimarrão todas as tardes, para a patroa. Limpou o chão. Então, foi, por fim, demitida. Depois passou em frente ao antigo trabalho, e viu pessoas sujando as calçadas que ela havia lavado com muito custo, num dia nublado que favoreceu seu receio de não conseguir limpá-las devidamente (com medo da chuva que ameaçava chegar). Continuou seu caminho, e sorriu, com certa nostalgia escondida.  

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Decompor e recriar


Fantasia
fanta
 anta
     asia
  anti
     asia,
 anti
 anta,
 anti
fanta.
Fantasia.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

O dia em que meu cabelo encontrou a terra


Me encantam demasiado esses olhos,
e esses fios com pretensão de serem como abóboras.
Pelos perdidos em face,
que se transformam em desenho
nessa fotografia,
juntos do olho que tudo e nada vê.
Cor de abóbora,
abóbora doce
como a ilusão de tê-la.





segunda-feira, 23 de julho de 2012

Conto sobre um velho solitário


A velhice é bem engraçada. Tem gente que morre jovem, logo em vida, como a FlorBela (que) Espanca o amor. Outros velhos que ficam morrendo e se matando psicologicamente antes da tão esperada morte física. Nestes casos que me pego refletindo. Vivem tantos longos anos, fazendo algumas coisas que não sei ao certo, por eu ter vindo alguns (60) anos mais tarde. Creio que nascem, aprendem coisas básicas e importantes, como plantar e cozinhar, então entram num casamento arranjado (e muito religioso), parem filhos, continuam existindo, se dão sorte – se amam, tornam-se avós, e então sofrem a morte que ainda não veio, mas morrem por sofrer a morte antecipadamente. E, então, enquanto esperam o fim (ou recomeço), ficam sentados numa cadeira de balanço, cantarolando músicas tristonhas e reconfortantes, com letras que dizem “espero que haja um lugar no céu para mim, e que as portas dele estejam abertas. Que lá eu encontre a felicidade”.

Porcarias


Tem alguma coisa
(que mesmo sem querer,
ao querer ver-te em fotografia),
que me traz saudade
de quando eu era tua,
sem você saber,
nem me querer.

Conto sobre uma confusão noturna


Estava tão despreocupada aquela noite quando, repentinamente, sua mãe a chamou para ver o céu. Ele estava coberto por nuvens que passavam rapidamente.

- Veja, filha: um, dois, três, quatro, cinco!, aviões voando. Nunca vi tantos aviões juntos no meu céu.
- Seria isso um ataque terrorista? Se benze, mãe. - e, ao falar isto, fez o sinal da cruz.

Ficaram perplexas, olhando os pontos cintilantes que passavam tão rapidamente, mas sem se mover. Mal sabiam elas que eram as nuvens passeantes que davam a sensação de movimento para as estrelas intactas no céu.



Às grávidas


Sinto-me mel
sinto-me`m moon
sinto-me mãe...

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Carta à uma amiga, sobre um sonho

Amora, sonhei contigo. Que lindo foi.
Resumidamente, havia um tiroteio ali no Mueller. A cada tiro que os policiais davam, era uma bomba que os bandidos soltavam dentro do prédio do Shopping.
Por algum motivo, estávamos lá dentro. Bandidos atirando para todos os lados, você com um violão e nós cantando serenamente Águas de Março. Alternando as frases, uma você cantava, e outra eu... "É pau, é pedra, é o fim do caminho..."
Um bandido olhou para nós com um olhar de "que bonito isso", trocou seu rumo, não atirou em nós e saiu correndo para matar alguém.
Enquanto isso, o prédio caía... Creio que a única parte que sobraria, era 1m2, bem alto, com nós tocando alegremente... Mas não sei, pois acordei.
Beijo


Dedico à rainha irlandesa celta da minha vida, Maeve A.

sábado, 7 de julho de 2012

Conto sobre uma morte em vida


Ficou ela, por fim, rodeada por flores. Flores nem sempre falsas, nem sempre vivas, porém bonitas. Sonhou, um dia antes, com certa despedida. Pequena lamentação que se materializou ao despertar. Era louca. Era louca quando viva.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Conto sobre um banho tomado rapidamente


Era uma vez uma Maria. Ela gostava de tomar banho. Sempre dava agrados e carinhos aos seus amores, sem saber que tudo o que ela dava, era tudo o que queria receber. Sempre dava. Nunca recebia em troca. Sempre se frustrava. Um dia ela estava tomando banho, um avião bateu em seu prédio e destruiu tudo. Morreu fazendo o que gostava. Fim.  




  
Foto Marlon R. Lopes

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Conto sobre as relações que secam sem querer


 Era um dia azul. Ela vestia azul para combinar com seus olhos. Seu acompanhante também trajava azul. Ambos sentaram num sofá (azul), próximo à janela, para contemplar o céu, que estava magnificamente lindo... e azul.
Em seu peito, ela abriu um espaço para o aconchego. Abraçou alguém, aquele dia.

    - Em que tanto pensas?, indagou ele.

    (Posso não te querer. Mas te quero perto. Quero-te bem. Quero-te assim. Quando tu deitas em mim, e meus dedos embolam teu cabelo, o puxando sem querer, não consigo voar no tempo. Não consigo sair do instante em que nos encontramos, não parto nem para o segundo seguinte. Fico presa nos nós dos teus fios, e não consigo sair deles. Sinta como está meu coração. Quase para, quase paro por inteira ao lado teu. Paro no tempo.)

    - Nada, em nada penso.

Claro que ela gosta do som que o silêncio faz, mas, naquele instante, preferiu elogiar a parede. Ah, sim, naquele dia, ela não só abraçou, como foi abraçada. Teve seu corpo envolto por braços que, sem querer, a protegiam de coisa alguma e de tudo, ao mesmo tempo. Até o instante em que se viu só (sem abraços) novamente. Sentiu-se perdida, até quando seu nariz se prendeu ao do outro. Enroscados, abraçados e no silêncio tão adorado por ela... ficaram assim por algum tempo, que ela (por estacionar nos instantes) não saberia ao certo quanto.

(Preciso ir. Não devo me sentir cheia e bela quando tu estás aqui. Preciso aceitar que as coisas acabam, e criar uma pausa breve. Não devo. Até quero. Mas não posso. Desejo-te. Não devo. Até quero. Mas não posso...)

    - Eu vou embora. - ela disse, por fim.

E, então, ela abandonou frigideiras, cozinhas, paredes, sofás e camas, argilas e saiu... sob o sol que raiava no céu azul.


Foto de M. Lopes 

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Conto sobre os morangos da infância


 Lembrei-me agora de quando eu subia nas árvores, que ficavam no lote da minha casa, no mesmo lugar em que eu colhia os morangos plantados pelo meu querido avô, na mesma época em que Cai Cai Balão era uma das músicas mais difíceis de tocar ao piano, por haver um acorde esdrúxulo, assim como em Capelinha de Melão, que tinha o acorde de fá, na sua segunda inversão. Mesma época em que cantar e tocar (com as duas mãos, muito rapidamente – claro) “o café com pão é muito bom, mas com manteiga é bem melhor, café com pão é muito bom, mas com manteiga é bem melhor” era a coisa mais divertida do mundo.
Lembrei-me, também, da emoção de ter o meu primeiro caderno de pauta (tenho a visão dele sobre um livro, em cima do sofá) e do cheiro da escola em que eu fazia piano (cresci sentindo aquele cheiro, e há pouco descobri que é a mesma fragrância do lustra-móveis que comprei para limpar minha casa).
Aliás, eu cresci. Os pés de morangos secaram, mas ainda haviam ameixas amarelinhas, jabuticabas e laranjinhas do céu (doces e azedíssimas ao mesmo tempo. Deveras: uma fruta dos céus). E as árvores (ah! As árvores) continuavam com as madeiras que meu pai, outrora, havia pregado para nós brincarmos (para mim, meus irmãos e vizinhos). Tinha também alguns balanços simples: uma madeira para sentar, suspensa por duas cordas que ficavam presas nas árvores da calçada. Mas que sorte a minha, ainda poderia sentar nas pedras, colher jabuticabas e encostar nas árvores depois das minhas classes de piano – mesmo não havendo mais morangos.
Os balanços arrebentaram (como sempre), as laranjinhas também secaram, eu mudei de casa, minha avó (que morava ao lado) também. O curso de piano acabou, meu avô morreu e a saudade dos pés de morango... ah! os pés de morango...estes também foram, mas ficaram, de certa forma.





segunda-feira, 2 de julho de 2012

Derradeiro


Confesso que não tenho sono,
que dormi antes para permanecer acordada
ao lado teu.
Admito, sim, que me despeço agora,
não por obrigações matinais,
mas para não olhar mais dentro dos teus olhos
que me sugam,
ainda que estáticos,
presos dentro de um retrato.


Ao adormecer


Cansei, vou comer
teu coração antes que
tu comas o meu.


Ao acordar


Quem tu pensas que és
para invadir meus sonhos ?
Tu que, em vida real,
estás tão longe de mim,
e dos meus pensamentos.



Ao antigo amor


Mal sabes tu
que desejo tanto teu bem.
E eu que outrora sofria
e derramava lágrimas
por um beijo teu,
hoje sinto tremenda felicidade
ao ver que
tu estás a suspirar,
a suplicar,
por um novo amor.
Bonito,
Não espero, e pouco me importa,
saber a fonte do teu prazer.
Na verdade não me importa.
Nem espero nada.

domingo, 1 de julho de 2012

Os olhos dela


Pequena minha,
Quando meu olhar cruza com o teu,
caio no abismo de pureza
que encontro nele.
Tens olhos de montanha.
São tão puros,
que chego a sentir medo.
Nunca vi tanta Serenidade assim.
Assusto-me com tamanha realidade,
antes fosse um sonho, mas não:
Teus olhos são reais,
e despenco dentro deles sempre.
São tão belos,
tu, por inteira, és tão Serena.