sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Conto sobre uma volta para casa



Hoje eu resolvi pegar ônibus com uns amigos e notei algumas coisas.

1- As pessoas ficam sem reação quando você conversa com elas, perguntando alguma coisa simples. Hoje perguntei para uma menina se ela lembrava qual música que tinha a frase "que pena". Essa foi bem receptiva, até cantou comigo. " O telefone, tocou novamente. Fui atender e não era o meu amor. Será que ela ainda está muito zangada comigo? Que pena! Que pena!"
Havia uma senhora, não tão velha quanto a sua aparência, que estava com um menino pequeno em sua proteção. Ela entrou na brincadeira do "estamos todos enlatados aqui dentro, parecendo sardinha." e até complementou dizendo "parece que estão carregando porcos, né?". Tudo na maior alegria, o que foi bem divertido.
Enquanto isso, pessoas olhavam estranho (segundo o que meu amigo falou). Mas eu não via problema algum em interagir e cantar no ônibus. Já dizia Belchior "Viver é melhor que sonhar", e, agora, digo mais: "cantar é melhor do que reclamar." . E melhor ainda é reclamar cantando e se divertindo - como fiz com poucos no ônibus.
Além desses dois casos, havia uma outra menina que estava segurando um livro espírita. Perguntei se era bom e ela não soube muito bem o que fazer. Entre um sorriso tímido e algumas sílabas, percebi que ela havia gostado. Depois de perceber que eu não era (tão) louca como parecia, ela até me disse que começou a ler o livro ontem (livro, este, que já estava quase na metade). E então o assunto desenrolou um pouco mais. Cedi o lugar VIP pra ela (como nomeei o único lugar do biarticulado em que não havia ninguém, por ser um canto apertado), e sai do apertomóvel.

2) No terminal, eu peguei outro ônibus. Agora estava eu e um outro amigo, apenas. Deixei ele sentar na única poltrona livre, pois eu desceria logo e primeiro. Foi por esse motivo que consegui ver a lua. Ela estava (e ainda está) tão linda lá no céu, que - sem querer- fiquei muda e perplexa. Automaticamente falei "Gente, olha a lua!! Que coisa mais linda!". Ninguém se mexeu. Na verdade, percebi olhares de quem olha para loucos ou drogados.

Se foi isso, não sei. Em todo caso, eu prefiro (sim!) ser louca, se é esse o nome.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Conto sobre a origem da complexidade


Tudo, em essência, é simples em demasiado. A complexidade nasceu concomitantemente com o surgimento do Eu. Eu quero, Eu preciso. Eu luto. Eu perco. Eu invejo. Eu mato. Eu complico. Egocentrismo. Tudo para Eu. Não digo que isso é bom, ou ruim. Digo que isso torna tudo mais complexo.  

Conto sobre um casamento que não aconteceu


Havia encontrado minha barba metade. Seríamos muito felizes. Eu estava começando meu trabalho como atriz e logo os projetos como clown estariam sendo executados. Nossas vidas seriam alegres, nossos filhos engraçadinhos e belos. Tudo seria colorido, xadrez (como nos filmes do Almodóvar) e eternizado nas fotografias que ele iria tirar. Tive essa sensação desde a primeira vez em que o vi. Mas aí descobri que ele era gay.  

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Conto sobre avós, pais e filhos


Vejo senhores, avós e pais, que acreditam no bem. Omitem seus passados obscuros e pregam o caminho certo para seus herdeiros. Acredito que fazem isso pela tão famosa experiência. Propagam tanto o que julgam ser correto, e acreditam fielmente que os mais novos os ouvem por completo. E, então, por certo egocentrismo (meus filhos são perfeitos, porque eu os pari), se cegam para os defeitos dos descendentes. Eles não mentem, não fumam, não bebem, não trepam, não invejam seus irmãos, não sofrem nem erram. Afinal, são seus filhos, não são humanos quaisquer.   

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Chuva



Sinto saudade de ti
cantando no ouvido meu,
enquanto aqueço a cama.
Sinto falta dos momentos em que estivemos juntos,
correndo, como crianças, pelas ruas.
São tantos pequenos detalhes
que me pego lamentando a falta
da frieza que só você traz.
E se eu pedisse,
você voltaria?  

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Conto sobre um instante exato de solitude

Pouco importa o corte ou a cor do cabelo que à ninguém será mostrado. De toda forma, não será apreciado. Sobre a combinação do vestuário, digo o mesmo. Ninguém será alvo do desejo de apreciação pelos trajes usados. Nem panos que cobrem o corpo, nem pelos que cobrem o crânio. O sucesso que espere, não há o desejo de estar preparado para ele também – não em todos os instantes, nesse momento da vida. Sem paixões, nem choros por (falta de) amor. Deixar existir, apenas, o risco em dizer “Nada como o doce gosto da liberdade”.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Conto sobre os sonhos de um segundo

Se não fosse o despertador...

- Vamos correr comigo na grama. Dar estrelinhas, cambalhotas e coisas de criança.
- Ah, não quero não.
E então ela acordou.

Conto sobre um momento de devaneio


E durante anos, quando não sonhava com amores, chorava por eles, todas as noites, antes de dormir. Acostumou-se tanto com a ideia de ter a paixão impregnada em si, que achava impossível a existência de viver um dia sem sentir borboletas de paixão em seu estômago. Até o dia em que percebeu que não havia mais ninguém para ela pensar nos momentos vagos. Então sentiu-se só e perdida .



sábado, 11 de agosto de 2012

Conto sobre um pensamento de solidão


Maldita solidão. Me roubou tudo, até as palavras. Colocou-me na ponta do abismo, ameaçando me arremessar no mar de memórias infernais. Suga-me para dentro de meus próprios olhos e não me deixa sair. Obriga-me a ficar incubada dentro de mim, presa à ela. Maldita solidão. Vá embora, e me deixe só.

Conto sobre quem se perdeu querendo se encontrar

Em uma ruela, roubou um punhado de flores e o colocou nos cabelos, para que você a percebesse. Queria te atrair pelo aroma da flor, mas era tão enjoativo que serviu apenas para espantar-te ainda mais. Voltou para procurar-te – em vão. Perdeu-se em passos ébrios. Perdeu-se como você, perdeu-se por ti. Mas ainda guarda a flor, com cheiro de morto – como diz sua filha.  

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Carta à filha


Faço das suas mãos,
Igualmente as minhas.
Ligeira e
Humildemente, assisto o seu cantar.
Ah, filha minha,
Atiraria mil pedras ao mundo
Da arte, para te ver brilhar.
O que uma mãe faz é inexplicável, algumas vezes.
Te peço meu perdão, se te magoei com verdades dilacerantes – não foi por mal.
Ingênuo e descrente é quem não
Vê a beleza que tu tens.
Acredita em mim, que eu te amo.

sábado, 4 de agosto de 2012

Conto sobre um bolo que não deveria ter sido feito


Certa vez, uma mulher resolveu fazer um bolo para a sua filha. Em casa, não haviam todos os ingredientes. Contudo, havia uma mistura pronta de bolo de fubá – porém, estava vencida. “Não tem problema, eu coloco mais fermento.”, pensou ela. Ao olhar a data de validade do fermento, viu que ele também estava vencido. “Não tem problema, eu coloco o dobro.” E assim o fez. Quando foi untar a forma, notou que não havia guardanapo. “Não tem problema, eu uso papel higiênico.”. Dessa forma, misturou até se cansar e perceber que a massa não ficaria homogênea (como o “modo de fazer” da caixinha falava para ficar). Colocou, então, a massa (embolada e vencida) na forma untada com papel higiênico e deixou assar. Pobre moça, o bolo ficaria uma delícia se ela não tivesse o esquecido no forno, o transformando em carvão.  

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Conto sobre o cabelo que se desprendeu, mas não desapegou


Era uma manhã nublada e estranha, porém uma manhã qualquer. Algumas meninas (jovens) andavam por uma estrada, também qualquer. Até que, por mania feminina, uma arremessou ao chão fios de cabelo que estavam suspensos nas costas da outra moça. Engraçadíssimo, o vento fez o chumaço de fios perseguir as moças. Obviamente, um clima de terror fora criado, devido ao maço de cabelo que não se desprendia da sombra da dona, e à uma mocinha qualquer (que acabou de entrar na estória), de aproximadamente três anos, que trajava uma roupa esdrúxula (como estudantes de filme estadunidense) e um olhar de assassina (este, existente apenas na cabeça das jovens abobadas). Começaram a correr, então, devido ao clima mentiroso de terror que criaram . Correram tanto que, ao atravessar a rua, morreram atropeladas, acompanhadas pelo medo falso dos fios de cabelo e da menininha, sob um céu escuro de uma cidade qualquer.